Apesar de imunizante japonês ter sido aprovado pela Anvisa, a previsão do laboratório é que análise se estenda até 18 meses; ano caminha para recordes de casos e mortes
Com aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde março,a primeira vacina contra dengue para uso amplo na população não deve chegar ao Sistema Único de Saúde (SUS) tão cedo. De acordo com integrantes do Ministério da Saúde, o imunizante produzido pelo laboratório japonês Takeda ainda precisa passar por análises internas antes de ser incorporado à rede pública, o que pode durar até um ano. Segundo o secretário Carlos Gadelha, a prioridade é fortalecer a produção nacional também no caso da vacina da dengue. Hoje, o imunizante é desenvolvido pelo Instituto Butantan, mas ainda não teve a pesquisa concluída.
Imunizante contra a dengue pode ser vendido entre R$ 400 e R$ 500
Batizado de Qdenga, o imunizante japonês teve demonstrada uma eficácia geral de 80,2% contra a dengue causada por qualquer sorotipo e pode ser aplicada em crianças acima de 4 anos, adolescentes e adultos até 60 anos de idade. Com o aval da Anvisa, ele deve ser vendido na rede particular a partir deste mês por valores entre R$ 400 e R$ 500.
O que falta para ser oferecido na rede pública?
Para ser oferecido na rede pública, porém, precisa ser avaliado antes pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec). De acordo com a pasta, o órgão analisa aspectos como “eficácia, efetividade, segurança e impacto econômico da nova tecnologia com base nas melhores evidências científicas disponíveis”. O pedido, segundo a Takeda, será apresentado ainda neste mês.
De acordo com a regulação da Conitec, o prazo para análise de medicamentos é de 180 dias, contados a partir da data do protocolo de solicitação do pedido. Esse prazo pode ser prorrogado por mais 90 dias, quando as circunstâncias exigirem. Por outro lado, a Takeda acredita que o processo de avaliação do dossiê “deve levar um tempo estimado de 12 a 18 meses”.
Imunizante do Instituto Butantan está em desenvolvimento desde 2009
O secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo da Saúde da pasta, Carlos Gadelha, afirma que o ministério prioriza implementar no sistema público produções brasileiras. No caso da dengue, o imunizante do Instituto Butantan está em desenvolvimento desde 2009. A previsão é que o estudo da vacina nacional seja enviado para análise da Anvisa somente em meados de dezembro de 2024. Na prática, a aprovação deve ficar para 2025.
— Quando a gente pensa em vacinas, é importante destacar o papel central da produção nacional. Hoje, o complexo industrial da saúde é estratégico e ajuda a salvar mais de 200 mil vidas. Por isso, a análise da vacina da dengue segue essa perspectiva de desenvolvimento tecnológico para cuidar das pessoas — afirmou o secretário, responsável por coordenar o processo de incorporação de tecnologias no SUS.
Brasil registrou 1,38 milhão de casos de dengue
Conforme o último informe semanal do Centro de Operações de Emergências de Arboviroses (COE Arboviroses), o Brasil registrou 1,38 milhão de casos prováveis de dengue até o início de junho, número que supera em 22% os registrados no mesmo período do ano passado. Do total, 15.519 foram casos graves e com sinais de alarme, e 635 resultaram em morte.
‘Pode custar vidas’
Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Alexandre Naime Barbosa alerta que o número de óbitos no primeiro semestre é mais da metade de todas as mortes pela doença registradas em 2022, quando houve 1.016 — o recorde em toda a série histórica desde 1980.
— Isso poderia ser reduzido caso uma vacina fosse implementada. Esperar uma vacina do Instituto Butantan pode custar vidas, principalmente dos grupos mais vulneráveis. O ministério deve ter sensibilidade para entender que essa vacina é necessária o mais imediatamente possível para alguns grupos — disse o infectologista.
Com 79,6% de eficácia, a vacina Butantan-DV é de dose única e indicada para pessoas de 4 a 59 anos, tanto para quem já teve a doença quanto para os nunca contaminados. Apesar de feita para proteger contra os quatro sorotipos do vírus da dengue, ainda não há dados de eficácia para os sorotipos 3 e 4, o que é uma outra preocupação do vice-presidente da SBI.
— Há uma boa perspectiva acerca da vacina do Butantan, mas ainda não existem dados publicados sobre a eficácia contra todos os sorotipos. Por mais que sejamos otimistas, ainda não temos esses resultados de forma palpável — disse.
Dengvaxia
A primeira vacina autorizada no Brasil contra a dengue, a Dengvaxia, do laboratório francês Sanofi, também nunca chegou ao SUS por apresentar riscos a quem nunca tinha pego a doença. Este imunizante está disponível apenas em clínicas privadas e é indicado somente para evitar reinfecções, que costumam ser mais graves.
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“Em relação à vacina Dengvaxia, o imunizante demonstrou aumento de risco de agravamento da doença para pessoas soronegativas, ou seja, que nunca tiveram dengue antes. Dessa forma, após discussões com o Comitê Técnico Assessor em Imunizações (CTAI), não houve a recomendação para a implantação do imunizante no Calendário Nacional de Vacinação”, explicou o ministério em nota.
O médico sanitarista Claudio Maeirovitch lembra que a Dengvaxia só foi mostrar problemas após sua aprovação no país, em 2015:
— Naquele momento, a vacina não demonstrava problemas, mas o ministério não tinha ainda concluído por sua indicação. O Paraná resolveu incorporá-la de forma independente, e, algum tempo depois, estudos demonstraram que ela tinha eficácia inferior para um certo sorotipo de dengue. Além disso, as pessoas que não tinham tido dengue anteriormente e recebiam a vacina ficavam com chance maior de ter complicações. Estava fadada a ser uma vacina de pouca adesão — afirmou o especialista.
Fonte: o globo/ Por Karolini Bandeira — Brasília