Município alegou parcelamento ilegal do solo para comercialização
Decisão da justiça
19/04/2022 | Remetido ao DJE Relação: 0257/2022 Teor do ato: Vistos. PREFEITURA MUNICIPAL DE TUPÃ ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Em síntese, alega a parte autora ser o requerido proprietário dos imóveis registrados sob matrículas de nºs 4079 (encerrada) e 5379 (encerrada), ambas do CRI local e matrículas derivadas 65.946 (encerrada); 65.947 (encerrada); 65.948 (encerrada); 65.949 (encerrada); 66060 e 66061, todas do Cartório de Registro de Imóveis de Tupã, cuja área, localizada no Bairro São Martinho, zona rural do Município de Tupã, tem sido objeto de parcelamento ilegal do solo para comercialização, mediante promessas de venda e compra, em áreas menores, individualizadas e previamente demarcadas, denominadas chácaras de lazer, totalizando aproximadamente 100 (cem) lotes, a caracterizar a alteração do uso do solo para zona urbana. Segundo alegado na inicial, referido parcelamento seria ilegal, pois realizado sem aprovação pelo Município, Estado, INCRA e demais órgãos públicos competentes, sem registro no Cartório de Registro de Imóveis e, estando a área desprovida de infraestrutura pluvial ou coleta/afastamento de esgoto, resulta em gravíssimo dano ao meio ambiente em razão do favorecimento do surgimento de erosões, edificação sem vistoria técnica, adensamento populacional, dentre outros, vez que em desacordo com a Lei nº 6.766/79 (artigos 3º, “caput”, 12, 18, 37 e 53). Por tais razões, requer o Município o deferimento da tutela de urgência consistente em impor ao requerido: 1) obrigações de fazer, para cumprimento no prazo de 15 (quinze) dias, consistentes em: 1.1) exibir os respectivos instrumentos e apresentar em Juízo relação de todos os lotes alienados e respectivos adquirentes, com indicação dos contratos já quitados, bem como da forma e local de pagamento das prestações vencidas e vincendas; 1.2) colocar e manter aviso (por placa ou faixa), na entrada do imóvel parcelado e de modo bem visível aos transeuntes, informando que o loteamento projetado não pode ser executado, por ser ilegal, indicando o número do presente processo judicial; 2) obrigações de não fazer, consistentes em se abster de: 2.1)realizar vendas, promessas de venda, reservas ou quaisquer negócios jurídicos que manifestem intenção de vender lotes do referido loteamento, bem como fazer a respectiva publicidade; 2.2) receber prestações, vencidas e vincendas, previstas nos contratos já celebrados e relativas aos lotes do parcelamento irregular; 2.3) praticar atos de parcelamento material (loteamento ou desmembramento) no imóvel adrede descrito, inclusive serviços de terraplanagem, topografia, abertura de vias de circulação e demarcação de quadras e lotes ou qualquer construção. Antes mesmo do recebimento da inicial, o requerido compareceu espontaneamente aos autos e apresentou contestação (p. 876/899). Em sede de preliminar, impugna o valor atribuído à causa, vez que, segundo alega, apenas 08 (oito) lotes foram comercializados, no valor total de R$ 2.080,000,00 (dois milhões e oitenta mil reais) e argumenta ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da ação. No mérito, alega que a ação foi proposta em evidente má-fé do Município e com o objetivo de perseguição contra si engendrada pela atual gestão municipal, vez que o Município, em razão de processo no âmbito administrativo, já tinha ciência do parcelamento da área em chácaras com metragem mínima de 20 mil metros quadrados, tal qual exigido pela legislação pertinente, e aptas à escritura, que será lavrada oportunamente, após a conclusão dos contratos e cumprimento das exigências feitas pelo Cartório de Registro de Imóveis de Tupã para tanto. Refuta a imputação da prática de crime ambiental de desmatamento da área controvertida, tendo-se em vista que o corte e a retirada das poucas árvores existentes no local foram precedidos de aprovação dos órgãos ambientais competentes, a saber, Polícia Ambiental e CETESB. Por fim, argumenta que não pode ser responsabilizado pela falta de infraestrutura no local, como também pelo subparcelamento do solo em áreas inferiores a 20 mil metros quadrados, decorrente da realização de contratos derivados dos contratos originários, na media em que, a partir da concretização da venda com o adquirente originário, não mais é proprietário do bem, inobstante figure como tal perante a autoridade registrária. Pretende o acolhimento da preliminar de ilegitimidade com a consequente extinção do feito e, no mérito, a improcedência do pedido. Juntou procuração e documentos (p. 900/1026 e 1032/1047). Parecer do Ministério Público, opinando pelo deferimento da tutela de urgência pretendida, p. 1.052/1.054. Réplica do Município, p. 1.056/1.062. Prestadas informações pelo Oficial de Registro de Imóveis de Tupã, instruídas com documentos, p. 1.063/1.065 e 1.066/1.132. É o relatório. DECIDO. À vista do comparecimento espontâneo do requerido aos autos, DOU-O por regularmente CITADO. No mais, o parcelamento do solo urbano vem regido pela Lei nº 6.766/1979, que define diretrizes a serem observadas nos casos de desmembramento, fracionamento ou loteamento do solo. Em seu artigo 3º, caput, referida Lei prevê que art. 3º: Somente será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal., com exigência de elaboração e prévia aprovação do projeto e respectivo registro imobiliário junto ao CRI competente como condição ao parcelamento, conforme artigos 12, caput e 18 da Lei regente. Como se vê, mencionado diploma legal impõe ao proprietário que pretenda o parcelamento do solo providências a serem previamente adotadas perante os órgãos públicos e Poderes competentes, bem como vedações, com vistas à ordenação urbana, preservação do meio ambiente e do interesse da coletividade (artigos 37 e 53). No caso dos autos, os documentos que acompanham a inicial (p. 33/874) indicam a probabilidade do direito do requerente e evidenciam o perigo de dano e urgência do pedido, pois demonstram o parcelamento irregular do solo em desconformidade com a legislação de regência, realizado sem prévia anuência dos órgãos públicos competentes, a implicar, portanto, em violação a dispositivos legais e normas cogentes. Além disso, referido parcelamento, nos moldes evidenciados nos autos, pode resultar em gravíssimos danos ao meio ambiente, os quais, em regra, são irreversíveis ou de difícil recomposição. De se destacar que, aliás, aludido parcelamento sequer foi negado pelo requerido em sua peça de defesa, na qual admitida a venda dos lotes a terceiros mediante contratos de promessa de venda e compra, muitos deles em fase de execução. Do mesmo modo, a iminente ocupação da área pelos terceiros adquirentes e a celebração de contratos derivados ocasiona previsível dano à ordem urbanística, de difícil desfazimento, podendo, inclusive, ocasionar violação a direitos da coletividade, os quais se sobrepõem aos interesses privados. Além disso, a existência de poucas edificações no local ampara a conclusão de ausência de consolidação no tempo do loteamento irregular, a autorizar o deferimento da medida de urgência pretendida para obstar a consolidação da área já alienada e a celebração de novos contratos de promessa de venda e compra da área alegadamente irregular, até o julgamento definitivo da presente lide. De se destacar que a tutela de urgência pretendida pelo Município requerente insere-se no âmbito do exercício da legitimidade por ele detida para regulamentar e fiscalizar o parcelamento, uso e ocupação do solo urbano, vale dizer, à organização urbana, decorrente do dever imposto ao Município de promover atos administrativos ou judiciais necessários e providências executórias para deter ou regularizar, quando possível, loteamentos irregulares ou clandestinos, caso evidenciado nos autos, ao menos em sede de cognição sumária. Diante do exposto, presentes os elementos ensejadores para o deferimento da tutela de urgência pretendida, DEFIRO a liminar, nos termos postulados na exordial, para DETERMINAR e IMPOR ao requerido as obrigações de fazer e não fazer a seguir discriminadas, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por dia de descumprimento, limitada ao teto de R$ 2.080.000,00 (dois milhões e oitenta mil reais), valor incontroverso da causa. Anoto que o termo inicial para a incidência da multa supra fixada será, para o caso de descumprimento das obrigações de fazer, a publicação da presente decisão, e, para o caso de descumprimento das obrigações de não fazer, a partir do 16º (décimo sexto) dia, inclusive, contado da intimação pelo DJE, conforme abaixo minudenciado: 1) obrigações de fazer, a serem cumpridas no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos supra, consistentes em: 1.1) exibir os respectivos instrumentos e apresentar em Juízo relação de todos os lotes alienados e respectivos adquirentes, com indicação dos contratos já quitados ou em fase de quitação, bem como da forma e local de pagamento das prestações vencidas e vincendas; 1.2) colocar e manter aviso (por placa ou faixa), na entrada do imóvel parcelado e de modo bem visível aos transeuntes, informando que o loteamento projetado é objeto da presente ação judicial, indicando o número do presente processo judicial e a Vara/Comarca na qual tramita; 2) obrigações de não fazer, a serem cumpridas de imediato a partir da intimação pelo DJE, nos termos supra, consistentes em se abster de: 2.1) realizar vendas, promessas de venda, reservas ou quaisquer negócios jurídicos que manifestem intenção de vender lotes do referido loteamento, bem como fazer a respectiva publicidade destinada à alienação ou negociação das áreas objeto do presente feito; 2.2) receber prestações, vencidas e vincendas, previstas nos contratos já celebrados e relativas aos lotes do parcelamento irregular; 2.3) praticar atos de parcelamento material (loteamento ou desmembramento) no imóvel adrede descrito, inclusive serviços de terraplanagem, topografia, abertura de vias de circulação e demarcação de quadras e lotes ou qualquer construção. CUMPRA-SE a presente decisão. Em razão da contestação apresentada, vista ao Ministério Público. À vista das informações prestadas pelo Oficial de Registro de Imóveis de Tupã, vista às partes e ao Ministério Público. |